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Simulação nos Negócios Jurídicos Imobiliários 

Raphael Augusto Almeida Prado 

De acordo com a doutrina majoritária, trata-se de um vício social, embora a simulação esteja prevista no art. 167 do CC/02, ou seja, fora do rol dos vícios do negócio jurídico. Ao contrário, porém das demais figuras até então analisadas, que geram nulidade relativa e permitem a anulabilidade do negócio, na hipótese de simulação haverá nulidade absoluta do ato.  

A simulação é um vício social do negócio jurídico que se apresenta quando há uma discrepância entre a vontade interna e a vontade manifestada pelas partes. A previsão de nulidade absoluta dos atos simulados guarda uma relação íntima com a ordem pública.  

A simulação pode ser absoluta, quando há, na aparência, um determinado negócio jurídico, ao passo que na essência, não há negócio jurídico algum. Há doutrinadores (Nelson Nery Jr, por exemplo) que defendem que o negócio seria inexistente, mas como o CC não adotou a teoria da inexistência, os vícios são resolvidos no campo da validade.  

Se houver ao mesmo tempo a fraude contra credores e a simulação, na prática, esta deve prevalecer, devendo ser manejada a competente ação de nulidade.  

Já na simulação relativa, na aparência, há um negócio jurídico simulado e outro negócio jurídico, na essência, dissimulado. Assim, o negócio simulado será nulo e o dissimulado será válido, atendidos aos demais requisitos legais. A simulação relativa é comum em negócios imobiliários em que as partes têm o intuito de fraudar o fisco, como na locação travestida de comodato e na compra e venda feita como doação.  

A respeito da simulação relativa, confira-se o Enunciado 293, da IV Jornada de Direito Civil:  

Na simulação relativa, o aproveitamento do negócio jurídico dissimulado não decorre tão somente do afastamento do negócio jurídico simulado, mas do necessário preenchimento de todos os requisitos substanciais de validade daquele.  

Logo, o negócio dissimulado será válido apenas se verificados os requisitos de validade previstos no art. 104 do CC/02.  

A simulação relativa apresenta dois subtipos, a saber: a) simulação relativa objetiva, em que o problema recai sobre o conteúdo do negócio jurídico, que apresenta um conteúdo inverídico, como uma declaração falsa constante de um contrato imobiliário; b) simulação relativa subjetiva, em que o problema recai sobre a pessoa com quem se negocia, não sendo ela o verdadeiro sujeito de direitos e/ou obrigações, como ocorre nos negócios celebrados por interposta pessoa, o famoso laranja.  

Em razão da máxima da vedação da própria torpeza, o CC/16 vedava que a simulação fosse alegada contra terceiros ou de uma parte contra outra, o que nos parece óbvio.  

Contudo, o art. 104 do CC/16 não foi absorvido pelo CC/02 e, segundo o Enunciado 294 da IV Jornada de Direito Civil, a simulação, por se tratar de matéria de ordem pública, passou a ser admitida como argumento de defesa entre as partes contratantes. Veja-se: sendo a simulação uma causa de nulidade do negócio jurídico, pode ser alegada por uma das partes contra a outra.  

A simulação também pode ser classificada como maliciosa ou inocente, sendo a primeira aquela que causa prejuízo e a segunda aquela que não o causa.  

A cessão simulada de créditos imobiliários para fraudar o interesse de credores é modalidade de simulação maliciosa, embora ambas gerem nulidade absoluta, por se tratar de matéria de ordem pública, sendo que, na prática, não há razão para se persistir essa distinção teórica, que surgiu sob a égide do CC/16, pois seu art. 103 previa que a simulação inocente não gerava a nulidade do negócio.   

Sobre o tema, o Enunciado 152 da II Jornada de Direito Civil já firmou entendimento no sentido de que toda simulação, inclusive a inocente, é invalidante.  

Confirmando a tese da invalidação dos negócios celebrados mediante simulação inocente, o STJ se manifestou no seguinte sentido:  

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA CUMULADA COM OBRIGAÇÃO DE FAZER. IMÓVEL RURAL PERTENCENTE A ESPÓLIO. PROMESSA DE DOAÇÃO DE ÁREA REMANESCENTE À VENDIDA. Ausência de anuência dos herdeiros quanto ao negócio envolvendo a área remanescente. Invalidade do ato. Omissão no aresto recorrido quanto à obrigação relativamente à meeira e à ocorrência de simulação inocente. Retorno dos autos à corte local para reexame dos embargos de declaração. Recurso parcialmente provido. STJ REsp 792.170/MG, Quarta Turma; Rel. Min. Raul Araújo, DJE 27/11/2015).  

A boa-fé de terceiros não fica suscetível a alegação de simulação pelos contraentes do negócio jurídico simulado, por força do §2º do art. 167 do CC/02. Logo, se há venda anterior na cadeia dominial atingida pela nulidade decorrente de uma simulação, o adquirente de boa-fé fica resguardado, prevalecendo o seu direito de propriedade.  

Ainda por se tratar de questão de ordem pública, o Enunciado 578 da VII Jornada de Direito Civil estabeleceu que, sendo a simulação causa de nulidade do negócio jurídico, sua alegação prescinde de ação própria, podendo ser conhecida de ofício.  

Há duas correntes que tratam do prazo para o ajuizamento da ação declaratória de nulidade. A primeira, defende que seria imprescritível, dado que o art. 169 do CC/02 estabelece que o negócio nulo não se convalida com o tempo. Por outro lado, há quem defenda o prazo de dez anos do art. 205, sob o argumento de que os direitos não podem ser perpétuos.  

O art. 168, além de estabelecer que a nulidade deve ser reconhecida de ofício pelo juiz, determina que qualquer interessado ou o Ministério Público, nos casos em que lhe caiba intervir, pode requerer a declaração de nulidade.