VENDA CASADA NO CRÉDITO RURAL: O CUSTO QUE PREJUDICA O PRODUTOR RURAL
Por Almeida Prado Advocacia Rural — escritório especializado na defesa do produtor rural e na revisão judicial de contratos de crédito rural.
1. O crédito rural e a armadilha da venda casada
O crédito rural foi instituído pela Lei nº 4.829/1965 como instrumento de fomento à produção agropecuária e fortalecimento do campo.
Porém, o que deveria impulsionar o agronegócio muitas vezes se transforma em um fator de endividamento, devido à prática abusiva conhecida como venda casada no crédito rural.
Essa prática ocorre quando o produtor é obrigado a contratar seguros ou serviços adicionais — como o seguro prestamista — como condição para liberar o financiamento.
O resultado é que o custo efetivo total (CET) da operação aumenta de forma oculta, reduzindo a rentabilidade da atividade e comprometendo o patrimônio do produtor rural.
2. O que diz a lei sobre venda casada
O artigo 39, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor (CDC) é claro: constitui prática abusiva “condicionar o fornecimento de um produto ou serviço ao fornecimento de outro”.
Essa conduta é vedada também nas operações de crédito rural, que são regidas por normas de interesse público e social.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já consolidou o entendimento de que “o contrato de seguro acessório ao contrato de financiamento, quando de adesão obrigatória, constitui-se em verdadeira venda casada” (AgRg no AREsp 554.230/SC).
3. Jurisprudência recente reforça o entendimento
Os tribunais estaduais têm reafirmado que a venda casada é prática abusiva, especialmente em financiamentos com seguros prestamistas obrigatórios.
Alguns exemplos recentes demonstram a posição consolidada do Judiciário:
- TJPR – Apelação Cível nº 0001562-18.2020.8.16.0068 (2024): reconheceu a venda casada em contrato de crédito rural e determinou a responsabilidade solidária do banco e da seguradora pelo aumento indevido do custo do financiamento.
- TJTO – Apelação Cível nº 0006533-27.2023.8.27.2722 (2024): afastou cláusulas abusivas e entendeu que o seguro embutido sem opção de escolha configura prática ilícita.
- TJMT – Apelação Cível nº 1023062-19.2018.8.11.0041 (2023): diferenciou o seguro penhor rural (legítimo) do seguro prestamista (abusivo), reconhecendo a venda casada e a elevação indevida do CET do crédito rural.
Esses precedentes evidenciam que, quando o produtor não tem liberdade para escolher a seguradora, há violação do princípio da autonomia da vontade e desequilíbrio contratual — fundamentos suficientes para revisão judicial.
4. O impacto econômico da venda casada: aumento do Custo Efetivo Total (CET)
O Custo Efetivo Total (CET) representa todos os encargos incidentes sobre o crédito — juros, tarifas, seguros e taxas.
Quando o banco impõe seguros obrigatórios, o CET é artificialmente inflado, comprometendo a saúde financeira do produtor rural.
Além de desrespeitar o dever de transparência previsto no artigo 6º, III, do CDC, essa prática fere os princípios da boa-fé objetiva e da função social do contrato, consagrados nos artigos 421 e 422 do Código Civil.
Por isso, tais contratos são passíveis de revisão judicial e eventual restituição dos valores pagos indevidamente.
5. Responsabilidade do banco e da seguradora
Os tribunais reconhecem que o banco estipulante do seguro participa da cadeia de consumo e responde solidariamente pelos prejuízos causados ao produtor.
Assim, tanto a instituição financeira quanto a seguradora podem ser condenadas à devolução dos valores indevidos e ao pagamento de indenizações.
Essa responsabilização decorre do entendimento de que ambos lucram com a prática abusiva e contribuem para elevar o custo do crédito rural além do permitido pela legislação.
6. Como o produtor rural pode se proteger
O produtor rural pode e deve adotar algumas medidas preventivas:
- Solicitar a planilha com o CET detalhado antes da assinatura do contrato;
- Pesquisar o valor dos seguros em outras seguradoras, garantindo liberdade de escolha;
- Guardar cópias de todas as propostas de seguro e faturas discriminadas;
- Consultar um advogado especializado em crédito rural para revisar os contratos e identificar abusividades.
Essas ações podem evitar prejuízos e servir de base para uma futura ação de revisão contratual, caso seja necessário.
7. Conclusão
A venda casada no crédito rural é uma prática ilegal e incompatível com a política pública de fomento ao agronegócio.
Ela distorce a finalidade do crédito, eleva o custo efetivo total (CET) e agrava o endividamento do produtor.
O Judiciário vem reconhecendo essas ilegalidades e determinando a restituição dos valores pagos indevidamente.
O produtor rural tem direito a um crédito justo, transparente e equilibrado.
A Almeida Prado Advocacia Rural atua em todo o território nacional, com foco na revisão de contratos de crédito rural e na defesa do produtor rural endividado, garantindo a preservação do patrimônio e do legado familiar.
Referências Normativas e Jurisprudenciais
- Lei nº 4.829/1965 – Política de Crédito Rural
- Decreto-Lei nº 167/1967 – Cédulas de Crédito Rural
- Lei nº 8.078/1990 – Código de Defesa do Consumidor
- Código Civil, arts. 421 e 422
- STJ, AgRg no AREsp 554.230/SC
- TJPR, Apelação Cível nº 0001562-18.2020.8.16.0068
- TJTO, Apelação Cível nº 0006533-27.2023.8.27.2722
- TJMT, Apelação Cível nº 1023062-19.2018.8.11.0041

